Os jovens brasileiros infectados pelo HIV têm comportamento descuidado em relação a transmissão do vírus para seus parceiros sexuais. Essa foi a conclusão que o psicólogo Renato Caio dos Santos chegou em sua pesquisa de mestrado na Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da USP (Universidade de São Paulo) sobre o impacto do vírus HIV entre os jovens do País. Por três anos, ele analisou os hábitos de homens infectados pelo vírus, entre 18 e 25 anos, que se tratavam no hospital Emílio Ribas, em São Paulo.
De acordo com Santos, os casos de HIV vem crescendo entre jovens do sexo masculino no Brasil. A proporção é de 18 casos de aids em homens para cada 10 mulheres. As regiões onde se concentram o maior número de casos são regiões Sul e Sudeste.
"Esses jovens que têm HIV não usam preservativo antes de descobrir que têm a doença e muito menos depois. Muitos dos jovens acham que as pessoas que têm um nível acadêmico elevado, de classe média alta, branco não estão sujeitos a contrair a doença, pensam que só pobres, negros que terão o HIV."
O resultado da pesquisa rendeu o livro Na Escuridão do Arco íris: a vivência das relações afetivo-sexuais de jovens gays após o diagnóstico de HIV, lançado neste mês. O psicólogo também publicou recentemente o livro Brincando com Fogo, que analisa por meio de estudos nacionais e internacionais o comportamento sexual de jovens com o vírus.
Veja a seguir a entrevista:
R7- Em geral, como está a situação do HIV no Brasil?
Renato Caio dos Santos- O Brasil apresenta uma estabilização dos casos nos últimos dez anos, com uma média de 20,5 casos para cada 100 mil habitantes. A grande questão é que a propagação vem aumentando entre jovens do sexo masculino. De certa forma, parece que os jovens homossexuais pensam "Ah, eu sou gay, porque não ter? É quase certo que terei a doença". Um dos entrevistados falou que era muito bom ele ter o diagnóstico positivo para HIV porque todas as pessoas já saberiam que ele é gay.
R7- Existe alguma causa que justifique esse comportamento?
Renato Caio dos Santos- Há aumento entre os jovens que não viram os primeiros anos da epidemia, não sabem o quão terrível foi. Muitos acham que as pessoas que têm um certo nível acadêmico, que são de classe média alta, brancos e etc não estão sujeitos a contrair a doença, pensam que só pobres e negros terão o HIV.
R7- Ainda existe um estigma muito forte que relaciona os homossexuais ao HIV?
Renato Caio dos Santos- As duas coisas se combinam muito e ainda há um preconceito muito grande. As pessoas ainda acham que o HIV é uma questão homossexual. No começo da epidemia, os travestis eram quem tinham a maior taxa de incidência da doença, hoje em dia, eles são o grupo com menor taxa de HIV.
R7- O que mais te chamou atenção ao realizar a pesquisa?
Renato Caio dos Santos- Esses jovens que têm HIV não usam preservativo antes do diagnóstico e depois muito menos. Um dos principais fatores que estamos associando é que eles não têm a noção do perigo, acham que dependendo da pessoa que eles se relacionam não há problema, pensam que o HIV tem remédio, que não mata. As campanhas do governo são focadas no diagnóstico, mas deveriam contemplar também o tratamento.
R7- Quando surgiu a ideia do livro Na Escuridão do Arco Iris?
Renato Caio dos Santos- O livro é resultante da minha dissertação de mestrado, enquanto o Brincando com fogo é resultado de minha dissertação de aprimoramento profissional. O primeiro livro fala do comportamento de jovens homossexuais, como fica a vida deles após a descoberta do vírus. O outro livro é focado nas experiências dos jovens, independentemente de orientação sexual, cor, raça ou posição social. Queríamos saber mais sobre essa molecada que já tem o HIV, como é a vida sexual deles após o diagnóstico.
R7- Qual foi a maior dificuldade em produzir as duas obras?
Renato Caio dos Santos- No Brasil, existe uma falta gigantesca de material sobre o assunto, não é nada que seja fácil de encontrar, mesmo em questão de artigos científicos. Toda a literatura que usamos para compor os livros é internacional, por exemplo. Para ambos os livros, algo que falamos muito é a importância das redes sociais e a troca de experiências para que os jovens possam encontrar outras pessoas que estão vivendo a mesma situação que eles.
R7- Qual sua opinião sobre os homossexuais não poderem doar sangue?
Renato Caio dos Santos- Isso é a coisa mais ridícula que existe. Em um período de até 12 meses, se você teve relações sexuais com alguém do mesmo sexo você fica impedido de doar sangue, mas na verdade, todo sangue coletado hoje em dia é testado em laboratório, independente do sexo da pessoa, então não faz sentido impedir alguém com uma orientação sexual X de doar. Se esse comportamento caísse em desuso, os bancos de sangue não teriam problema de estoque.
Fonte : R7